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Tudo aquilo que sou...
Fotografia: Raquel (euzinha)
Agora que já organizei as respostas das cartinhas acumuladas na caixa de correio, que já vos respondi aos comentários...
Agora que já matei as saudades da familia, dos amigos...
Agora que já namorei muito (mesmo sabendo a pouco)...
É hora.
Quero partilhar. Dizer que se ao partir senti medo, parece-me agora um mal necessário.
Adorei sentir na pele uma forma estranha de liberdade. Sentir-me estranha. Ver-me por dentro e ver toda a minha vida de longe.
Era isso que pretendia. Foi isso que consegui.
Claro que eu, mulher rude do campo, sem nunca ter saído deste meu país à beira mar plantado (Espanha não conta), vi tudo de uma forma talvez muito maior do que realmente é. Mas na verdade, devo ter parecido uma burra a olhar para um palácio. Deslumbrada ao mesmo tempo que tudo me parecia esquisito.
Por fora não sofri nenhuma alteração. Nem podia. No máximo, emagreci pela fome que passei. Entre comidas diferentes mas sempre com o mesmo sabor, comida chinesa ou mexicana, eu fiquei-me pelas batatas fritas, bolachas e maçãs.
Pronto, OK, venho com uma corzinha. E aproveito para dizer que é um bocado chato uma gaja sair de 40º para chegar aqui e voltar a usar lãs e botas. Fica aqui a reclamação.
Se calçava os ténis em cor de laranja, onde quer que fosse, sempre havia alguem que me dizia que gostava dos meus sapatos.
E agradecia enquanto pensava para mim que não são sapatos, são ténis. Só para começar. E alem disso, são apenas uns ténis cor de laranja! (E eu é que pareço parôla???)
Claro que, nos supermercados, quando se dirigiam a mim com aquela simpatia que lhes rasga um sorriso profissional, aproveitei para responder em português e observar a reacção de quem ouve e não faz ideia do que lhe dizem. Mai nada, para não se armarem em senhores-muito-importantes-donos-do-mund
Parei nos Estados de Nova York e Pennsylvania.
Viajei pelos Estados de California, Nevada, Arizona, Novo México, Colorado, Wyoming, Nebraska, Oklaoma e Texas.
E podem calcular as vezes que precisei mostrar a identificação aos oficiais da Imigração...
Talvez consigam calcular os km que percorri e a variedade de coisas que vi.
Bom... não vi nenhum Tornado. Coisa, que, sinceramnete, não me deixa triste.
Mas passei por paisagens incriveis e pelas 4 estações do ano.
E posso dizer, sem hesitar, que gostei de visitar Beverly Hills e ver as mansões de gente pobre. Gostei de visitar Malibu e banhar os pés no Oceano Pacifico (fiquei receosa dos tubarões!), Los Angeles, Phoenix... que achei giro ver o Tom Cruise ao meu lado no seu Ferrari vermelho e ir ao Zoo de San Diego (e que bom era que por semana os nossos tivessem as visitas que aquele tem por dia!). Gostei das reservas dos Índios, do deserto de White sands, de ver o Rio Colorado em paisagens tão diferentes... entre tantas coisas mais.
Mas no topo fica Las Vegas (no grupo de paisagem urbana) e o Grand Canyon (no grupo de paisagem natural).
Cidade é cidade. O homem imagina e cria. Em Las Vegas perdi a cabeça e aventurei-me nas loucuras do Stratosphere. Não, não me atrevo a mostrar fotos a quem quer que seja que pareço uma anormal. Mas consegui ir apesar de só pedir que Deus fosse Português, ou que pelo menos entendesse o meu pedido de ajuda! eheheheheh
Fica apenas uma foto que tirei do observatório. E vão com sorte.
A natureza tem sempre em mim um impacto diferente. E por mais que quisesse, não vos conseguia descrever o que senti no Grand Canyon. É preciso ir. Ver. Sentir.
Porque é simplesmente fascinante de tão soberbo que é.
Era tudo tão XXL que a roupa, só mesmo de criança.
Tudo estranho para uma beirã.
E eu ali, de olhos arregalados a achar um bocado esquisito as portas das casas de banho publicas não serem completamente fechadas, do papel higiénico ser mais largo, das sanitas parecerem entupidas. De não ter nada em tamanho pequeno, de pedir um copo de água e pouco falta para me apresentarem um garrafão. E os teclados, enfim, claro que dá nos nervos não ter acentos para escrever correctamente (ou o melhor possivel).
Às rectas imensas das estradas e a não ter que pagar portagem. A ver as pessoas com 3 vezes o meu peso. A comprar tabaco aos mais variados preços e recorrer aos Índios para o comprar mais barato.
Era eu a viajar de camião, a dormir no camião, a comer no camião. 4 dias sem tomar banho (não, não me orgulho nadinha). A fazer pausas em paragens de camiões para ir fazer xixi e ouvir as mulheres a peidarem-se sem me conter no riso fácil. Ou brincar com outros motoristas via rádio.
Eram os olhos fixos em mim que afinal, nem me incomodaram nadinha.
Era o vizinho a pedir-me um beijo na boca.
Era eu a ouvir o meu nome distorcido.
Eu na piscina para aproveitar o calor que se fazia sentir em Lake Havasu City.
Era eu de mecânica nos ultimos dias para conseguir chegar a horas ao aeroporto.
Era eu de bagagem a rebentar pelas costuras a chegar ao aeroporto em cima da hora, com as lágrimas nos beirais, com um medo a consumir-me por sentir que podia não ser capaz. Mas fui...
Era eu que só me apetecia soluçar quando comecei a ouvir falar Português, em Philadelphia.
E eu, mais tarde, depois de 40 horas sem dormir a chegar a uma Lisboa de nuvens em forma de algodão doce a romper um azul de céu... onde me esperava um homem de olhos humidos que me fez rebentar as lágrimas há tanto tempo presas pela saudade. Sem flores, sem palavras. Um abraço apertadinho e uma multidão de olhos fixos em nós.
E agora estou aqui. De regresso à minha casa, à minha cama, à minha banheira, à minha musica, ao meu carro, ao meu blog.
A procurar um trabalho.
A viver um inicio de uma história de amor.
Com esta sensação em mim... a de que sonhei, ou que ainda não parti.
Como confissão: a todos vós, vos repito, de coração, o meu obrigada. Pela ajuda que me deram, pela coragem e pela presença. Amigos sem voz nem rosto, amigos de sombra, que estiveram aí. E isso, vale o que vale. Afinal, não é preciso muito mais... e acredito que saibam o carinho que vos tenho.
Se tenho horas em que me sinto útil quando depois do blog me chegam à caixa de correio com cartinhas que expressam ou disfarçam pedidos de ajuda, ou as outras em que se procura apenas alguem para conversar, tambem voces têm na minha vida, um papel muito importante. É por isso que não me canso de vos dizer que vos agradeço...muito.
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